7 de maio de 2025
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“O Eternauta”: São Jorge contra a invasão alienígena

Série argentina com Ricardo Darín mal estreou e já é a mais assistida na Netflix Brasil. "O Eternauta" conta a história de uma invasão alienígena e tem Buenos Aires como cenário.
3 de maio de 2025
Ricardo Darín e elenco de "O Eternauta".
Ricardo Darín e elenco de "O Eternauta". Foto: Netflix.

Sai a Estátua da Liberdade, entra o Obelisco; sai a Times Square, entra a Avenida 9 de Julio; ao invés do Brooklyn, San Isidro. Desta vez, a invasão alienígena tem como cenário a Argentina, e não os Estados Unidos. Finalmente, os nossos visitantes extraterrenos descobriram que há vida inteligente no resto do mundo. E que ótimo que isso aconteceu! Mas este é apenas um dos muitos atrativos de “O Eternauta”, uma belíssima ficção científica com Ricardo Darín que acaba de estrear na Netflix. Todos os seis episódios da primeira temporada já estão disponíveis.

“O Eternauta” é uma produção Netflix baseada na icônica graphic novel de Héctor Germán Oesterheld e Francisco Solano López, publicada originalmente em 1957 – veja aqui em português. Durante muito tempo, a HQ foi considerada por muitos como impossível de adaptar para o audiovisual. Mas parece que a maioria estava errada, porque não só a transpuseram para as telas, como fizeram um trabalho artístico impecável.

A trama se inicia em uma noite bem quente de verão em Buenos Aires, quando uma misteriosa nevasca tóxica irrompe na capital argentina. A luz acaba em todo o país (quiçá no mundo). Carros e eletrônicos deixam de funcionar. As bússolas ficam loucas. O mar recua. Alguma coisa está muito errada com a Terra. Qualquer pessoa que tenha contato com os flocos de neve simplesmente cai duro, morta. Milhões de pessoas perdem suas vidas nesses primeiros dias de apocalipse sul-americano.

Juan Salvo (Ricrdo Darín), um veterano de Las Malvinas devoto de São Jorge e seus amigos, na casa dos 60, anos estão jogando truco (e não pôquer, como nos filmes americanos!) no porão de casa no momento da “virada de tempo”, percebem o que está rolando e iniciam uma luta desesperada pela sobrevivência. Este é apenas o início de “O Eternauta”.

A partir de agora, spoilers

Como se o drama de Juan e seus amigos não fosse pequeno o suficiente, tudo muda mais uma vez quando o grupo descobre que a nevasca é apenas a primeira fase de uma invasão alienígena da terra. Centenas de besouros do tamanho de carros começam a invadir as ruas e atacar os sobreviventes. Eles fazem ninhos por toda parte. A única maneira de os argentinos sobreviventes resistirem é lutando juntos, pois ninguém se salva sozinho.

Juan, que passa a ter uma série de alucinações estranhas, veste roupas impermeáveis e uma máscara antiga. É arriscado. Mas, mesmo assim, ele vai para a rua. Com essa proteção, ele descobre que está protegido. O homem deixa a proteção da casa do seu amigo e parte em busca da filha.

Após encontrar a filha, Juan e seu grupo vão se juntando a outros sobreviventes argentinos e descobrem um destacamento do exército argentino, que organiza um contra-ataque contra as criaturas gigantes. Quando a nevasca passa e eles conseguem furar um bloqueio alienígena, comemoram como se tivessem vencido a ameaça. Mas começa, então, uma terceira fase da invasão: parte das pessoas, controladas pela inteligência alienígena, começa a se infiltrar nos grupos militares, civis e paramilitares.

As visões que atormentam Juan se intensificam, e ele se dá conta de que já viveu aqueles acontecimentos. No final da temporada, Juan decide investigar uma luz azul que emana, forte, de dentro do Estádio Monumental, do River Plate. Ao chegar perto, vê que essa luz vem da criatura humanoide que controla os besouros e os seres-humanos.

“O Eternauta” é uma super produção

Dirigida por Bruno Stagnaro, a série foi filmada entre maio e dezembro de 2023 em mais de 35 locações reais em Buenos Aires, utilizando tecnologia de produção virtual para criar cenários imersivos. O elenco inclui, além de Darín, Carla Peterson, César Troncoso, Andrea Pietra, Ariel Staltari, Marcelo Subiotto, Claudio Martínez Bel, Orianna Cárdenas e Mora Fisz.

A série aborda temas como sobrevivência, solidariedade e resistência coletiva diante de ameaças externas. A adaptação mantém o espírito da obra original, que é considerada um marco na ficção científica latino-americana. O autor da graphic novel, Héctor Germán Oesterheld, foi desaparecido pela ditadura militar argentina em 1977, e seu neto, Martín Oesterheld, atuou como consultor na produção da série.

Ricardo Darín em "O Eternauta".
“O Eternauta” já está disponível na Netflix. Foto: divulgação.

“O Eternauta” não demonstrou, até o momento, nenhuma crítica política ou social muito evidente. Mas ela está lá – com certeza. Nas últimas décadas, os argentinos passaram por poucas e boas. E parecem viver agora um ponto crítico com o governo de extrema-direita de Milei. A nova série da Netflix aposta numa resistência nacional com heróis coletivos, gente simples, gente extraordinária que tenta sobreviver aos novos tempos e ameaças extraordinárias. Essa gente luta contra os próprios companheiros que estão sendo controlados e manipulados pelo inimigo. Às vezes são famílias partidas, pais, filhos confusos e que não conseguem perceber a realidade – algo bem familiar para nós brasileiros, não é mesmo?

A direção de arte de “O Eternauta” é absolutamente fabulosa. Os cenários de nevasca e de destruição massiva – tudo é muito bem produzido e divertido. No Brasil, no momento em que esta crítica é escrita, a série é a mais assistida de todas. E merecido. “O Eternauta” é uma daquelas séries para ver numa tacada só, até porque é meio difícil começar a ver e parar. Ao fim, o gostinho de quero mais fica na boca. Queremos ver mais do enfrentamento entre São Jorge e a invasão alienígena. Que venha a segunda temporada!

Bruno Leal

Doutor em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor do Departamento de História da Universidade de Brasília. É editor do portal Café História e colabora esporadicamente para o Bonecas Russas.

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